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Minhas Perguntas ao Cabo Anselmo – Por José Renato Nalini*

O Desembargador José Renato Nalini fez parte ontem da Bancada do Programa Roda Viva da TV Cultura que entrevistou  controvertida e famosa personagem da política brasileira, o cabo Anselmo.  Cabo Anselmo  iniciou  suas atividades na esquerda e depois passou a colaborar com a Revolução de 1964.

Doutor Nalini, por fim, fala que mesmo após a entrevista, não conseguiu formar opinião sobre Cabo Anselmo.

Abaixo, as considerações do Desembargador Nalini a respeito da noite de ontem, as perguntas que queria ter feito mas, infelizmente, não teve oportunidade, já que eram diversos entrevistadores, assunto vasto e tempo curto.

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Convidado a participar do revival do RODA-VIVA no formato antigo, procurei revisar o que sabia sobre o polêmico personagem que ficou conhecido como “Cabo Anselmo”.

Após a leitura do material encontrado nas fontes de pesquisa disponíveis, elaborei 12 questões, das quais pude fazer duas. Eram elas:

1) Como foi que o senhor chegou a ser Presidente da Associação dos Marinheiros e Fuzileiros Navais do Brasil aos 23 anos? Qual havia sido a sua formação política para chegar a esse posto?

2) O discurso pronunciado em 25.3.1964 e que deflagrou o golpe e deposição de João Goulart não foi escrito pelo senhor (foi escrito por Carlos Lamarca). Mas o conteúdo refletia a sua posição política?

3) Quando o senhor foi preso, em 30.5.1971, vivia com Edgar Aquino Duarte, amigo dos tempos da Marinha. Sabe o que foi feito dele? O senhor tem algo a ver com isso?

4) Por que o Diretor do DOPS carioca à época do golpe de 1964, Cecil Borer (*1913-+2003), disse dois anos antes de morrer, que o senhor já servia ao DOPS do Rio, ao Cenimar – Centro de Informações da Marinha e à CIA?

5) Aquela versão de fuga auxiliado pelo Polop – Organização Política Operária, não reforça a tese de colaboracionismo anterior a 1971? Por que o senhor tinha a chave da cela e foi autorizado a sair pela porta da frente da prisão sob a desculpa de se encontrar com uma mulher? Todos os presos gozavam dessa regalia?

6) Quantas pessoas morreram em virtude de sua delação?

7) Há pelo menos duas versões de sua cooptação pelo sistema que antes combatia. Uma delas é a de que houve tortura. Outra, a de que foi seduzido pela argumentação convincente do delegado Sérgio Paranhos Fleury, de quem veio a se tornar amigo. Qual delas é a verdadeira?

Qual a sua mensagem para um jovem – não necessariamente marinheiro – que queira ingressar na política brasileira em 2011?

9) Qual o saldo da atuação da esquerda após 50 anos?

10) A que o senhor atribui a dificuldade na obtenção de documentos comprobatórios de sua existência civil? Houve tentativa de obtenção de segunda via do assento? Tentou fazer um registro tardio? (não sabia, até então, que ele foi registrado aos 6 anos).

11) Qual o seu atual relacionamento com os amigos da fase 1964/1971? E com os da fase 1971 até à morte do Delegado Sérgio Fleury? Com quais se relaciona ainda hoje?

12) Valeu a pena?

Confesso não ter uma opinião formada sobre o entrevistado. Consegui que ele assumisse a falta de ideologia ao se confessar um ator quando da leitura da famosa carta. Terá sido ator durante toda a entrevista? Chocou-me a tentativa de atribuir à Soledad a responsabilidade por sua morte cruel e infamante. E por sugerir que os fins justificaram os meios. Acenou com a intenção de “serenar os ânimos, impedir a guerra civil” ao delatar os amigos. Ainda que isso importasse na morte deles.

Enfim, ao afirmar que “vive em paz consigo mesmo e com Deus” deixou-me dúvidas sobre essa misteriosa capacidade das pessoas de removerem da consciência tudo aquilo que possa causar desconforto.

Será que na “Comissão da Verdade” alguma verdade virá a ser dita? Ou estaremos condenados a nunca saber qual foi o seu efetivo papel nesses tempos de obscurantismo que aconteceram ainda ontem e que reclamam urgente acerto de contas?

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Como o doutor Nalini, todos os que assistiram ao programa ficaram com muitas perguntas sem respostas.  Próximo Capítulo, “Comissão da Verdade”.  É torcer para que esse lado obscuro da nossa história, nem tão recente assim,  seja um pouco mais desevendado.

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*José Renato Nalini é Desembargador do TJSP, ex-Presidente da Academia Paulista de Letras.