De 19.01.07
Segunda-feira ensolarada à tarde, há cerca de 20 anos. Vi pelo espelho interno do carro que atrás de mim estava grande ídolo do Brasil. Logo adiante, no semáforo vermelho, ficamos lado a lado. Naquela época não havia essa obsessão por vidros negros/à prova de bala, e ambos estávamos de janelas abertas (em tempo, não tenho, nunca tive e nem pretendo ter os famigerados vidros pretos). Pois bem, ele olha para mim. Aceno. Demonstrando imensa irritação pelo meu “imenso atrevimento”, ele levanta o braço esquerdo, como que me mandando passear, ou para lugar muito mais longe, e vira o rosto.
Três anos atrás, estou no Itaim Bibi trancando a porta do carro que acabara de estacionar. Na calçada, ao meu lado, sujeito conhecidíssimo que na hora não consigo identificar. Parece que existe um tempo determinado limite pelas normas de boa convivência – talvez de três segundos ou quatro segundos – que nunca deve ser ultrapassado quando se olha para um desconhecido. Como não se tratava de desconhecido e a sensação de não me lembrar me incomodava, ultrapassei em muito esse tempo. Ao contrário do primeiro, que uma olhadela e um ingênuo aceno foram suficientes para causar-lhe imensa irritação, um sorriso ilumina seu rosto de galã de cinema e, com sotaque carregado do Interior, me saúda:
– Boa tarde!!!!!!!!!!
Retribuo o cumprimento e o sorriso mas ainda leva alguns instantes para me lembrar de quem se tratava.
O primeiro era o Sócrates; o segundo, o Raí.
Durante um tempo fiquei encafifado com a diferença de astral entre eles. Depois me dei conta de que meu “encafifamento”, esse sim, era um despropósito. Na minha família mesmo – entre meus irmãos – há dois Raís, minha irmã mais velha e eu, um Sócrates e outros que, embora não sejam Sócrates, estão a léguas de Raí.